Sobre o ato de escrever

Alexandre Borges
2 min readAug 23, 2024

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“Eu acordo cedo e foco unicamente na escrita por cinco a seis horas todos os dias. Pensar tão intensamente e por tanto tempo sobre as coisas faz seu cérebro superaquecer (com meu couro cabeludo literalmente ficando quente às vezes), então depois disso preciso dar um descanso para minha cabeça. É por isso que passo minhas tardes cochilando, curtindo música, lendo livros inofensivos. Esse tipo de vida, no entanto, acaba com seu físico, então todo dia passo cerca de uma hora fazendo exercícios ao ar livre. Isso me prepara para o trabalho do dia seguinte. Dia após dia, sem exceção, repito esse ciclo.

É meio clichê dizer que é um processo solitário, mas escrever um romance – especialmente um realmente longo – é exatamente isso: um trabalho extremamente solitário. Às vezes, sinto que estou sentado sozinho no fundo de um poço. Ninguém vai me ajudar, e ninguém está ali para dar um tapinha nas minhas costas e me dizer que fiz um ótimo trabalho. O romance que produzo pode ser elogiado pelas pessoas (se sair bem), mas ninguém parece apreciar o processo em si que levou a isso. Esse é um fardo que o escritor deve carregar sozinho.

Acho que sou uma pessoa muito paciente quando se trata desse tipo de processo. Ainda assim, às vezes fico de saco cheio e odeio isso. Mas à medida que vou trabalhando, perseverando dia após dia – como um pedreiro cuidadosamente colocando um tijolo sobre o outro – chego a um certo ponto onde tenho a sensação definitiva de que, no final das contas, ser escritor é exatamente o que sou. E aceito essa sensação como algo bom, algo a ser celebrado. O slogan dos AA (Alcoólicos Anônimos) nos EUA é “Um dia de cada vez”, e é exatamente isso que isso é. Manter um ritmo constante, carregando firmemente um dia após o outro e enviando-os no seu caminho. Continuando silenciosamente a fazer isso e, em certo ponto, algo acontece dentro de você. Mas leva tempo para chegar a esse ponto.”

Haruki Murakami

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